sábado, 4 de abril de 2015

Cinderella e os Sentimentos Além da Superfície



Refilmagens sempre são encaradas com desconfiança pelos fãs do filme original. E não sem certa razão, embora recontar as mesmas histórias seja uma tradição humana milenar. Se você refilma um clássico como o longa animado Cinderela (direção: Clyde Geronimi, Hamilton Luske, Wilfred Jackson) produzido por Walt Disney em 1950 é natural que haja ainda mais ressalvas.

Sempre gostei muito do trabalho do diretor Kenneth Branagh, inclusive seu Hamlet, mas fiquei decepcionado com a saída de Mark Romanek da direção de Cinderella. E também temia que este fosse mais um filme a entrar na onda revisionista de "o que está por trás da lenda". Todos estes medos provaram-se tolos ao ver esta bela refilmagem. 


Sim, o filme nos brinda com humor e ambientes de tirar o folego(filmados com verdadeiro senso de magia), mas o que realmente me seduziu foram os preciosos momentos de sincera humanidade dos personagens.

A delicadeza da infância de Ella, a doçura do relacionamento dela com seus pais, imediatamente nos torna cúmplice da personagem em tudo pelo que sabemos ela irá passar.

Desde que assisti ao filme eu estava pensando em como escrever sobre ele. Que ângulo abordar. Dizem que muitas vezes vejo nos blockbusters significados muito profundos ou muito "artísticos" para um filme comercial, mas realmente acredito que qualquer história bem contada tem este potencial para nos tocar. Para mim é daí que Cinderela realmente acerta: nos importamos com os personagens.



Em um dado momento vemos a expressão de desgosto, quase tristeza, no rosto da Madrasta quando ela ouve Cinderella e o pai falando sobre a mãe da moça. Quando Ella desce as escadas do palácio em direção ao baile, sim a câmera busca a grandiosidade dos salões, mas a principio o diretor confia na expressividade de sua protagonista para transmitir ao público o deslumbramento da festa. É antes na expressão do rosto dela que sentimos o genuíno encantamento. Isto sem falar nos momentos ternos entre O Rei adoentado e seu filho.

Há uma certa(e inesperada) consciência da fragilidade da vida que permeia o filme: a morte dos pais de Ella, a doença que ameaça o Rei e a morte do primeiro marido da Madrasta. Cada um dos três reage ou reagiu(no caso da Madrasta) de uma maneira e isso os define como personagens e pessoas.





Para minha surpresa Cate Blanchett não rouba o show como  Lady Tremaine. O filme mostra-se muito equilibrado: Richard Madden confere a dose certa de masculinidade e vulnerabilidade ao Príncipe. Derek Jacobi traz um ar legítimo de realeza e sabedoria ao rei. As irmãs adotivas (Holliday Grainger e Sophie McShera) são caricatas na medida certa. 


Vale destacar que a sempre carismática Hayley Atwell (Agente Carter) é a mãe da personagem.



Claro, Helena Bonham Carter abraça o papel da Fada Madrinha com visível prazer. Para ela e para nós.



E quanto a Cinderella? Não poderia ter havido escolha melhor do que Lily James. Diria que Marc Davis, animador de Cinderella no clássico animado e de muitas outras heroínas Disney, ficaria orgulhoso dela. A britânica carrega o papel com altivez e simplicidade. E consegue transparecer toda a gentileza e coragem que está no coração da personagem com o olhar.



No final, é um filme deliciosamente emocional e divertido, que não tem medo de contrariar a onda de revisionismo sombrio de filmes anteriores e abraça o legado disneyano de encatamento. Talvez mais importante: um filme que encontra sua força nos sentimentos de seus personagens tanto quanto na beleza de sua produção.

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